Mais um filme sobre segregação racial nos EUA e mais uma
história verídica que acaba bem. Mas será só isso? Será mais um filme familiar
para ver sentado num sofá domingo à tarde? Vamos ver…
12 Years a Slave conta-nos a história de Solomon Northup,
um Afro-Americano livre que depois de burlado vê a sua liberdade existir apenas
na possibilidade de respirar. É levado para o mercado dos escravos e acaba nas
plantações do sul dos EUA para trabalhar até ao dia em que eventualmente
morrerá. Sabendo nós que a história é verídica e que o senhor acabou por
publicar um livro, podemos concluir de início que no final do filme ele
reencontra a sua família.
A verdade é que Steve McQueen não pega neste filme para
contar uma história. Aquilo que faz é tentar pegar no espectador e colocá-lo o
mais perto possível do lugar do Solomon (agora chamado Platt). Sem sentir-mos
dor física, isso só será possível através de dor emocional e psicológica. Tudo
isso através de cenas de uma intensidade violenta brutal, acompanhadas por uma
banda-sonora desconfortante, que fazem qualquer pessoa querer virar o olhar e
desejar que tudo aquilo acabe. É um filme difícil de engolir, digamos assim, é difícil
acreditar que tal acontecesse há menos de 2 séculos atrás. Mas só é assim
porque o trabalho de Steve McQueen atrás das câmaras é inegavelmente brilhante
e consegue transportar-nos para aquela dimensão de sofrimento. Cheguei a querer
desviar o olhar pela violência a que estava a assistir, mas acabei por ficar,
hipnotizado, a apreciar o trabalho do realizador. O uso de takes prolongados
traduzem uma coordenação brilhante e só seria possível com o uso destes
actores.
O cast utilizado neste filme é electrizante. A cada capítulo
que passa vemos actor atrás de actor, a aparecer e a terminar a sua personagem
com uma contribuição cada vez mais preciosa para a construção desta obra. Paul
Giamatti, Paul Dano, Benedict Cumberbatch, Michael Fassbender, Brad Pitt e
claro o protagonista interpretado por Chiwetel Ejiofort. Este último, com
aquela que será sem dúvida a performance do ano (2013) e com a qual,
provavelmente, arrecadará a estatueta mais desejada da temporada. Porquê? Basta
ver a sua expressão facial constante, de uma tensão tal que nem o permite mover-se
dentro da sua livre personalidade. É de reparar numas das principais cenas de
todo o filme, quando um dos escravos é enterrado, o “funeral” dá-se entre os
trabalhadores com uma cerimónia humilde ao som do Gospel. Solomon ouve calado,
mas à medida que a música cresce ele sente a necessidade de transportar toda a
dor que carrega e acaba por se entregar aos cânticos, numa cena memorável em
que é perfeitamente visível a dor, agonia e desespero de Platt.
É um filme pesado onde a pipoca do cinema não têm lugar. É
intenso, desconfortante, revoltante, triste e não pode ser comparado a qualquer
outro filme do género. Para mim, uma verdadeira obra-prima do cinema. Mas
cuidado… não é fácil de engolir!
★★★★★
Spoilers.
ResponderEliminarNós somos testemunhas e nada fazemos para alterar a sua situação.
E quando o olhar dele caiu sobre mim, senti vergonha...
Prémios valem o que valem, que o filme seja visto é que interessa.
Dificilmente alguém sai da experiência igual.
Como disse a Amy Poehler, "faz nos ver a Escravatura com outros olhos"...